23.9.06

CLUBE DOS POETAS ETERNOS - CARPE DIEM

(Um post do meu blog pessoal, datado de 10/6, que partilho aqui...)

CC




«Alguma vez na vida e, no momento oportuno, é necessário acreditar no impossível»



Ao longo da minha carreira de docente - já com 23 anos - tenho partilhado com as pessoas-alunos, com quem estabeleço sempre laços de amizade profunda, os meus 'tesouros privados'. Passagens de livros, músicas, pintura, paisagens, filmes...

O espólio do 'belo' torna-se mais belo quando o partilhamos. Tal como a chama de uma vela, que pode acender muitas outras, que acenderão ainda mais...

Nas últimas aulas, como base de um trabalho de escrita argumentativa para avaliação, (re)vimos juntos o filme 'Clube dos Poetas Mortos'.
Conheço bem os cerca de 120 jovens com quem tive a alegria de trabalhar este ano lectivo. Conheço-os pelo nome. Conheço-os pela essência... pelo sorriso que não mente, pelos olhos infinitos repletos de sonhos e de esperança. Conheço-os pela cultura diversificada de onde são oriundos. Conheço-os pela alegria que generosamente partilham comigo. Conheço-os pelos desgostos, que transbordam em palavras nos intervalos, quando me procuram e me acompanham pelos corredores, em passo lento, tentando prolongar o tempo para me 'dizerem de si'. E eu ouço-os. E sinto-os.

Numa época em que tanto se tem falado da Srª ministra da educação e das... das considerações que surgem aliadas a propostas inqualificáveis para o ensino/professores... eu optei por me alhear dessas aberrações que constituem notícias diárias, num crescendo de imposições que em nada beneficiam o ensino - muito pelo contrário - e que nem a ficção igualaria. Confesso: desliguei-me desse rol de ataques pessoais à classe profissional dos docentes. Optei por continuar a fazer, com o prazer e o profissionalismo de sempre, aquilo de que gosto muito - uma vida dedicada à docência... a única profissão que me completa.

'Clube dos Poetas Mortos' (a quem eu chamo eternos) é um filme de excepção. Ninguém fica indiferente a este filme, não apenas pelas interpretações brilhantes, mas porque abre a caixinha onde cada um guarda os sonhos e murmura o aviso: 'Carpe Diem'.

Após algumas considerações sobre o filme, cujo (re)visionamento recomendo vivamente, deixarei aqui algumas reflexões de alunos meus, escritas esta semana.

~***~




Um hino à vida no filme
"O clube dos poetas mortos":


O "Clube dos Poetas Mortos" convida-nos a resgatar emoções tantas vezes caladas em nome do progresso e de uma ordem social instituída.
Do passado ressoam vozes que nos devolvem o perfume e o sabor das sensações inocentes e genuínas de que a vida nos alheou e que não fomos capazes de reencontrar nos horizontes da memória.
É que a vida só faz sentido quando- como nos ensina Thoreau -, lhe soubermos "sugar o tutano", ou seja, quando a fruirmos na sua verdadeira essência. Foi por isso que Thoreau abandonou o Progresso e a Civilização e se refugiou na floresta, perto de Walden Pond, tomando como interlocutora privilegiada a própria Natureza. É por isso que Keating sugere aos seus alunos que quebrem as grilhetas que os acorrentam a uma existência sensaborona e deixem transbordar as emoções que vivem em si. Para isso, importa que saibam acolher o chamamento e os ensinamentos daqueles que melhor souberam celebrar a vida: os poetas, em cuja Arte resplandecem as afeições da Humanidade.
Efectivamente, da frase bíblica " nem só de pão vive o Homem", aplicada ao presente contexto, talvez decorra que "nem só de conhecimentos científicos vive o Homem ", já que, como revela Keating "man writes Poetry not because it is cute, but because he is part of the Human Race." 1
Keating, não obstante o ensino tradicionalista que lhe foi ministrado (na mesma escola aonde, anos mais tarde, viria a ser professor), sempre soube corresponder aos ideais estéticos dos clássicos, como dos românticos, de Shakespeare como de Whitman, sem nunca pactuar com uma visão tecnicista da Literatura, que a reduz a um fenómeno mensurável e quantificável.
Também os seus alunos, depois de terem colhido os ensinamentos do mestre, se predispõem a experimentar a filosofia do carpe diem . Assim , as reuniões dos jovens na floresta (na senda de Thoreau e do próprio Keating) permitem-lhes saborear os aromas e paladares da vida, consubstanciados nas palavras dos poetas do passado. Destas reuniões, os jovens regressam mais solidários e fortalecidos, mais confiantes e autónomos, mais livres e amadurecidos.
Depois do encontro com os grandes mestres da Literatura, os alunos de Keating recusam-se a ser objecto da vontade dos adultos, e atrevem-se a delinear os seus próprios objectivos e percursos existenciais. Lamentavelmente, uma Revolução nunca se faz sem que algumas vidas humanas sejam sacrificadas. A vítima desta Revolução foi Neil, o jovem que voluntariamente se recusou a hipotecar a sua alma de artista a uma carreira médica (provavelmente muito bem remunerada).
A administração da escola apressa-se a encontrar um culpado para a morte de Neil. Recusando auto - penalizar - se por ter, ano após ano, coarctado a liberdade dos seus alunos, convertendo-os, assim, em rebeldes potenciais, o director escolhe um alvo mais vulnerável: Keating, que acusa de ter incutido em Neil o desejo de se insurgir contra as determinações do pai.
A expulsão de Keating não consegue deter a marcha da renovação; os ideais e lições de Keating encontraram guarida nos corações dos seus discípulos, plasmando-se claramente no comportamento destes, no final da história.
Por outras palavras, "aniquilou-se" o "capitão", mas permanecem as suas hostes. Já acontecera com Lincoln,2 o homenageado do poema de Whitman que abre com o vocativo "Oh, Captain, my captain". Como tinha assegurado o próprio Keating, não há nada que se possa opor ao curso da liberdade: "it was always thus, and always thus will be ". 3

*



1 Uma tradução possível será : "O Homem escreve Poesia, não pelo facto de ser "giro" fazê-lo, mas pelo facto de ele (homem ) fazer parte da Raça Humana."
2 Abraham Lincoln foi um dos principais responsáveis pela abolição da escravatura nos Estados Unidos da America. Foi eleito Presidente em 1860,e embora tenha sido assassinado em 1865, pouco tempo depois do termo da Guerra Civil, é a ele moralmente que se deve a ratificação, no mesmo ano de 1865, da 13ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos, que decretou a abolição da escravatura.
3 Uma possível tradução será : "Sempre foi assim, e sempre assim o será "

~***~

' (...) «Carpe Diem!», ou melhor, «Vive o dia... agarra o momento!», é a grande mensagem que este belíssimo filme nos tenta transmitir. Passamos a vida à espera de ter tempo ou então a trabalhar arduamente para depois ter tempo. Mas tanto nos viciamos neste ciclo de correria que, ou caímos de cansaço ou, quando esse tempo vem, já não sabemos senão esgotá-lo na rotina que criámos. (...) O tempo não é inesgotável e (...) importa começar a abrir nele, no tempo que hoje nos é dado, clareiras destinadas ao essencial, porque o resto é que pode esperar. Se colocarmos o essencial no horizonte longínquo dos nossos ideais, corremos o risco dramático de não o chegar a viver e a nossa existência seria uma oportunidade perdida! (...) '

Joana Catarino, ESJCP, 10º C

' (...) Gostei muito do filme e saliento o culminar do mesmo, no qual a amizade e o respeito têm um papel fundamental. Noto que é importante ver as adversidades da vida de modos diferentes, conhecer cada coisa de todas as formas, aprender a ver virtudes e defeitos, ser crítico e elogiar. Não devemos sujeitar-nos à primeira impressão ou a estereotipos. (...) Os limites são cruciais e é importante que sejamos nós a defini-los. (...) '

Ana Isabel Garcia, ESJCP, 10º A

' (...) Um dia alguém me fez ver que a expressão Carpe Diem é uma das certezas do mundo, mesmo sabendo que o mundo está cheio de incertezas. Agora sei olhar o dia, não como mais um dia, mas como sendo aquele dia. (...)'

Sara Realista, ESJCP, 10º A

'(...) mas já que as forças divinas, ou meros incidentes biológicos, nos deram o dom de pensar, sentir e compreender, porque não acrescentar mais etapas e momentos que completem a nossa vida tão finita, cultivando pequenos momentos de satisfação eterna? (...)'

Cheila Pinto, ESJCP, 10º A

'(...) a arte de saber viver consiste pois nisto mesmo, no equilíbrio do prazer e da obrigação, sem que um esmague a presença do outro. (...)'

Carlos Daniel Bento, ESJCP, 10º C

'(...) Não sabemos o dia de amanhã. Por isso não se deve fazer grandes planos para o futuro, mas sim abrir os caminhos para o futuro.(...)

Ricardo Santos, ESJCP, 10º F

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Citações do filme



"Fui à floresta viver de livre vontade, para sugar o tutano da vida. Aniquilar tudo o que não era vida. Para, quando morrer, não descobrir que não vivi". - Henry David Thoreau

"Duas estradas divergiam num bosque e eu segui pela menos usada. Isso fez toda a diferença" - Robert Frost


"A pujante peça da vida continua e tu podes contribuir com um verso".